Esclarecendo Mitos sobre o Behaviorismo


O Behaviorismo foi uma ciência criada no início do século XX, por John B. Watson, o qual, inicialmente, era chamado de Behaviorismo Metodológico, devido ao seu foco nos métodos científicos. Matos (1995) conta que para os behavioristas metodológicos, a “observação” passou a ser um termo e uma operação fundamental, definindo assim, o “comportamento” como seu principal objeto de estudo. Para ser observável, o comportamento deveria ser acessível aos sentidos de todos, caracterizando uma verdade por consenso, e, para que todos concordassem com o que estivessem vendo, era necessário um treino rigoroso nos procedimentos de análise e registro.
Ao se manifestar contra a tão disseminada filosofia mentalista, a qual concedia poderes controladores do comportamento a algo externo ao corpo, como mente, consciência, alma e afins, Watson formulou uma teoria tão dualista quanto aquela (Matos, 1995). Influenciado por Pavlov, o autor reconheceu que o comportamento respondia ao ambiente, e por isso, era apenas uma resposta a estímulos ambientais antecedentes, ou seja, o agente controlador permanecia externo ao corpo. O ambiente era capaz de alterar o indivíduo biologicamente, e essa alteração seria, portanto, o comportamento. Sendo assim, os eventos internos foram abandonados ou ignorados por não poderem ser observados por consenso. A principal manipulação experimental de Watson era a reprodução do modelo S R (estímulo – resposta), a qual posteriormente foi motivo de críticas por sua pobreza explicativa do fenômeno comportamental. Além de muito criticado, o Behaviorismo Metodológico foi por muito tempo conhecido como a “psicologia do outro”, uma vez que priorizava o consenso perceptivo de duas ou mais pessoas (Skinner, 1974).  
Devido a esse histórico, ainda hoje, muitos mitos permanecem sobre a ciência behaviorista no meio acadêmico, sendo apontada como uma visão mecanicista do ser humano, fria e simplista. Esse estereótipo está presente no filme Laranja Mecânica (Stanley Kubrick, 1971), por exemplo, o qual apresenta a ciência comportamental como mero emparelhamento de estímulos.


O Behaviorismo Radical
Os novos nomes que surgiram para se contrapor ao Behaviorismo Metodológico tinham alguns princípios em comum, como por exemplo, (a) todos partiam do princípio evolucionista da continuidade entre as espécies e (b) a aprendizagem era um fator essencial à compreensão do comportamento. Esse novo grupo de pesquisadores com ideias inovadoras foram chamados de neobehavioristas. Embora compartilhassem certas perspectivas, o foco nas pesquisas em como a aprendizagem se processava foi o ponto principal em que os neobehavioristas discordaram, não permitindo, portanto, uma unificação de ideias (Goodman, 2005).
Entre os neobehavioristas responsáveis por trazer inovações ao Behaviorismo de Watson estão: Edward Tolman (1886-1959), que deu forma empírica para processos não observáveis com a criação do Behaviorismo Intencional; Clark Hull (1884-1952), afirmou que todos os comportamentos possuíam propriedades mecânicas e quantificáveis; Edwin Ray Guthrie (1886-1959) propôs uma teoria da aprendizagem menos complexa ao considerar que os movimentos são aprendidos por associação simples de estímulo e resposta e, finalmente, Burrhus Frederic Skinner (1904-1990) trazendo a ideia de que todo comportamento é passível de contingências de reforço, além de aplicar dados de laboratório a demandas reais da psicologia (Schultz e Schultz, 1992).
Skinner foi considerado por muito tempo, o mais influente psicólogo de sua geração. Seu trabalho na pesquisa científica do comportamento humano foi considerado a renovação dos pressupostos de Watson. O autor inovou os conceitos behavioristas por descartar especulações sobre o que acontece dentro do organismo humano referentes a entidades internas como variáveis intervenientes ou processos unicamente fisiológicos (Schultz e Schultz, 1992).



Segundo Skinner (1953) o comportamento dos organismos é um objeto de estudo concreto, objetivo e passível de acessibilidade para as pessoas, mas sua complexidade o torna uma matéria extremamente difícil. Pelo fato de ser um processo e não uma “coisa”, não pode ser imobilizado e estudado minuciosamente. No entanto, essa complexidade não significa que seja um objeto de estudo insolúvel, é preciso, portanto, certo grau de criatividade e engenhosidade de cientistas comprometidos com seu trabalho.
As inovações do Behaviorismo Radical consistiram em introduzir um novo sistema, no qual explicações comportamentais que seguiam a tradição de “causa e efeito” são substituídas por descrições de relações funcionais entre ambiente e comportamento (Skinner, 1953). O autor enfatiza que o comportamento dos organismos não é apenas influenciado por estímulos ambientais antecedentes, mas também pelos eventos consequentes. Sendo assim, Skinner introduz o conceito do paradigma operante, um dos principais diferenciais em sua teoria. O paradigma operante enfatiza a importância das consequências na modelagem dos comportamentos animais, sendo assim, segue o modelo da tríplice contingência S – R  S (estímulo antecedente – resposta – estímulo consequente). Dessa forma, Skinner abandona por completo a noção de causalidade mecanicista. Portanto, a premissa principal de um behaviorista radical seria a de que o comportamento do indivíduo é capaz de produzir mudanças em seu ambiente, e o ambiente, por sua vez, pode alterar a forma com que o indivíduo se comporta.
A introdução do paradigma operante modificou antigos conceitos sobre a aprendizagem, trazidos pelo Behaviorismo Metodológico, e trouxe uma nova perspectiva sobre as culturas humanas. Ou seja, Skinner (1981) enfatizou o papel dos eventos conseqüentes no âmbito ontogenético e cultural em sua teoria chamada seleção por consequências. Influenciado pela teoria da evolução de Darwin, Skinner sugere uma analogia da seleção natural das espécies com o processo de aprendizagem comportamental dos indivíduos. Assim, da mesma forma que características genotípicas são passadas para gerações futuras no processo de evolução dos animais, os comportamentos “mais adaptativos” podem ser selecionados a despeito de outros “menos adaptativos” através do processo de reforçamento e passados para gerações futuras pelo processo da linguagem (Skinner, 1981). A história ontogenética e cultural do sujeito tornaram-se, segundo a nova teoria, elementos fundamentais para a aquisição do repertório comportamental humano.
Outra contribuição advinda do paradigma operante foi a introdução de um novo conceito de comportamento verbal. Segundo Skinner (1957) esse tipo de comportamento também está sujeito à modelagem por consequências e é definido pelas mesmas leis comportamentais que definem outros tipos de comportamento. Portanto, o comportamento verbal também pode ser caracterizado como um comportamento operante. O que de fato diferencia o ser humano do animal não-humano é o potencial vocal desenvolvido ao longo de sua história filogenética, o qual foi selecionado de forma diferente dos outros animais e que possibilita a emissão de sons mais complexos. Mas, de qualquer forma, os treinos ontogenético e cultural se fazem necessários para o estabelecimento desse tipo de repertório (Skinner, 1957).  
Certamente, a sofisticação da comunicação humana possibilitou o relato verbal de eventos internos, quebrando uma barreira entre privado e público. O autor afirma que estados internos são eventos extremamente importantes para o campo da psicologia e que seria loucura ignorá-los, como foi feito no Behaviorismo Metodológico, apenas pelo fato de duas ou mais pessoas não poderem acessá-los. O autor afirma também que os eventos internos, como o pensamento e o sentimento, também estão sujeitos a estimulação ambiental e se caracterizam também como comportamentos (Skinner, 1974).
Dessa forma, os behavioristas radicais rejeitaram por completo o dualismo entre mundo interior e exterior, bem como explicações confusas do comportamento. Segundo Baum (1994), para os behavioristas radicais, a definição do comportamento consiste em “todos os eventos sobre os quais podemos falar com nossos termos inventados.” (p. 45).  Para o autor, “descrições pragmáticas do comportamento incluem seus fins e o contexto no qual ocorre. Para o behaviorista radical, termos descritivos tanto explicam quanto definem o que é comportamento.” (p. 46). O trabalho desses profissionais na prática inclui-se em outra categoria dessa ciência, que se chama Análise do Comportamento (Schultz e Scultz, 1992).



Por: Maíra Matos Costa


Referências Bibliográficas

Baum, W. M. (1999). Compreender o Behaviorismo: Ciência, Comportamento e Cultura. Porto Alegre. Ed: Artmed.
Goodman, C. J. (2005). História da Psicologia Moderna. São Paulo. Ed: Cultrix.
Matos, M. A. (1995). Behaviorismo Metodológico e Behaviorismo Radical. In: Rangé, B. Psicoterapia comportamental e cognitiva: pesquisa, prática, aplicações e problemas. Campinas: Editorial Psy.
Skinner, B. F. (1953). Ciência e Comportamento Humano. São Paulo: Martins Fontes.
Skinner, B. F., (1957). O Comportamento Verbal.São Paulo. Ed: Cultrix.
Skinner, B. F. (1974). Sobre o behaviorismo. São Paulo: Ed. Cultrix.        
Skinner, B. F. (1981). Selection by consequences. Science, 213, 501-514.
Schultz, D. P. & Schultz, S. E. (2001). História da Psicologia Moderna. São Paulo: Cultrix.





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